sexta-feira, 1 de junho de 2012

Carta de quem não serei.

Oi Tia

Jamais pensei em voltar aqui ao Catumbi, sobretudo nestas atuais circunstâncias. Ainda mais após a “ascensão” social de nossa família. Primeiro à tijuca, depois à barra da tijuca e por último à Gávea, quanta evolução num só clã. Hoje retorno onde jamais pensei voltar, nem por passagem. Alias, pensei sim em retornar aqui, mas apenas morto, para habitar o ataúde ao lado de vovó no nosso famoso cemitério. O berço da nossa família é hoje a cova viva e morada deste teu querido sobrinho marginal. Estou preso neste cárcere há cerca de dois meses e não sei ao menos se daqui a cinco horas estarei vivo ou se esta carta sequer chegará a suas mãos. Aqui a alimentação é péssima, os alimentos já nos são oferecidos abertos, eu nem posso ver as informações nutricionais e continuar a nossa dieta diária. Mas continuo magro, talvez devido à rotina intensa de exercícios deste lugar, ou mesmo pela tristeza mesclada com o futuro incerto que se personificam num tumor incurável que ostento em meu estomago, o sinto como um bolo na garganta que mantém a minha “saciedade”. Nem lexotan, nem rivotril e nem a nossa amiga sibutramina seriam tão eficazes. Tive muitas alucinações aqui dentro, não sei dizer o que foi real e o que foi sonho, mas tanto faz. Tudo que me ocorre aqui dentro se torna real, é o único material que possuo, eu comigo mesmo. Conheci um pastor aqui dentro, e por incrível que pareça, ele é o único com quem consigo manter uma conversa num grau superior do intelecto, ele tenta me ungir todos os dias ao senhor Jesus, mal sabe ele o quanto já estou ungido. (risos) Enfim, escrevo-te, pois sei que mesmo que do seu jeito, fostes a que mais me compreendeu nesta vida. Desde as minhas crises de TOC ou as minhas respostas aos ataques de papai. E eles como estão? Já esqueceram que um dia tiveram um filho? Ainda fingem que aquele aborto em 91’ deu certo? Nem sei por que pergunto, esta carta jamais terá uma resposta, talvez pergunto a mim mesmo se ainda possuo genitores. Por mais árdua que esteja sendo esta nova vivência de minha vida, não paro de exercitar meu lado Polyana, além de minha famosa ironia. Todos os dias procuro ver o lado bom disto e ironicamente sorrio para todos, buscando vida no inferno.

Um beijo sem forças quase.

Ps. Te amo para sempre. Não se esqueça de mim. Nunca.

Nenhum comentário:

Postar um comentário